3.1.10

Morrer de amor

Cassandra estava muito, mas muito angustiada. Alguma coisa estava lhe tirando a concentracao, a visao distorcia, suas forcas desapareciam. Levantar da cama era algo extremamente dificil, pois seus bracos e pernas pesavam toneladas... Esse simples despertar, lhe custava no minimo duas horas ate' conseguir chegar ao banheiro. E depois? Pensava logo. "Tenho que reagir" era sua resposta imediata. Mas nao conseguia! Ter ido a privada foi o unico que suas forcas lhe permitiram. Voltou para a cama e encontrou o livro "Veronika decide morrer" de Paulo Coelho. A historia de uma moca que tenta se matar com overdose de comprimidos, mas nao consegue. Acorda em um hospital, e o medico vem lhe dar a noticia: a tentativa de suicidio tinha lhe trazido danos irreversiveis ao coracao, e por isso, tinha no maximo 5 ou 6 dias de vida. Vitoria! Foi a reacao de Veronika.Aquilo deixava Cassandra enfurecida, pois queria estar dentro da historia, do livro. Ja' havia tentado de varias formas se matar, e nada como na historia, por exemplo, deixando uma sequela. Por isso, foi uma tentativa, e nao um suicidio. Algumas pessoas "tentam" se matar, quando outras ja' estao mortas, pensou Cassandra. Como seria a melhor forma de morrer, de fato? Deveria descobrir por iniciativa propria. Ha muito tempo atras, tinha cortado os pulsos. Nada. Nao lhe trouxe a morte, e tampouco danos posteriores. Algumas cicatrizes, sim. Depois com comprimidos. Comecou com dosagem baixa para sentir o "drama". Acordou na madrugada com o coracao a mil por hora. Tentou se levantar, mas nao suportou, e caiu no chao. Que horror; estava decidida de que aquela forma seria preterida. Depois ouviu falar em overdose de drogas. Noite acordada cheirando cocaina... Ah, comecou a levantar voo! Sim, era a Mulher Maravilha, assim se sentia a moca. Sol nascendo, e o sofrimento: garganta. Comecou a fechar, e asfixia seria uma questao de horas. Que terror; foi correndo ao posto medico. Depois das mal sucedidas tentativas, tentou aprender com as experiencias alheias. A primeira delas foi a de um adolescente que auxiliado por internautas, descobriu a melhor forma. Acender duas churrasqueiras a carvao dentro do banheiro e esperar. Nao, aquilo seria asfixia tambem! Entao, Cassandra comecou a imaginar que no final das contas, nao existia morte sem sofrimento para o suicida. Um tiro na cabeca? Nao, aquilo era impensavel para ela. Muito traumatizante para aqueles que ficam. Ela queria algo mais romantico. Ja' sei, morrer de amor! Comecou a planejar seu final. Primeiro teria que se apaixonar, loucamente. Esse amor seria imensuravel, mas tinha um problema. Tinha que ser platonico, pois se fosse correspondida, o final seria a la "Romeu e Julieta" de Shakespeare. Era exatamente isso que Cassandra nao queria, fazer mal ao proximo e muito menos que alguem se apaixonasse por ela. E se meu amado morrer e eu nao?!? Comecou, entao, a procurar numa comunidade virtual velhos amigos, agora distantes. Na verdade, aqueles que de alguma forma amava; so' nao sabia como se aproximar "mais". Alguns minutos se passaram quando, de repente, ah, encontrei! Na epoca que se conheciam ele era apenas um estudante de psicologia, e agora, nao somente formado, mas "doutor". Sim, um psicologo seria meu par ideal, pensou. Alguem que me entenda, finalmente. E logo, descobriu algo que lhe fazia admirar mais ainda aquela pessoa. O Doutor era tambem um "terrorista de genero". O problema e' que nao tinha a menor ideia do que aquilo significava, e por isso mesmo lhe chamava mais a atencao. Como saber? Perguntando para ele, pois era a fonte perfeita com tantos anos de estudo. Mas ao manter contato com meu amado, estarei quebrando o "platonico", o charme de morrer sem ser correspondida. Em seguida, viria a morte por inanicao, pois amor tira a fome, e seria o maximo morrer por um terrorista de genero! Resolveu arriscar e mandou uma mensagem: "Oi, tanto tempo sem receber noticias suas. Espero que esteja tudo bem contigo. Algo me intriga no seu perfil. Terrorismo de genero, o que e' isso exatamente? Voce poderia me dar uma luz? O google tampouco me ajuda muito..." Cassandra nunca obteve reposta.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Personagens

Cassandra: tradutora que trabalha para importante editora especializada em livros de biografia e historia. Ela e' o tipo de pessoa que nao consegue se encaixar numa vida social normal; encontra, muitas vezes, no isolamente, sua fulga, e nos livros seu refugio.

Cassandra: a translator who works for an important publisher specialized in biography and history books. She is the kind of person who cannot fit in a normal social life; she finds, most of the times, in self-confinement,
her scape, and in books, her refuge.
____________________________________________

Napo: ex-filho de militar e roteirista de cinema cuja vida foi acabada pelo alcool e drogas. Esta' em constante conflito interno consigo mesmo: perturbado, afetado. Atualmente, vive de pensao do sindicato.

Napo: ex-military-kid and film screenwriter whose life was ruined by alcohol and drugs. He seems to be always in a long-lasting and permanent state of self-conflict. Nowadays, he lives from the Union's financial support.
____________________________________________

Garcia: cobrador de onibus e membro ativo do partido comunista. Possui ampla biblioteca particular sobre o tema, tornando-se inclusive referencia partidaria. As vezes, seu fanatismo torna-se tao paradoxo que passa a ser ate' mesmo romantico.

Garcia: bus driver and member of the communist party. He became a political reference in the party due to the large collection of books in his private library. Such a fanatic with paradoxical ideas that sometimes he is called "The Romantic".
____________________________________________

Franz: editor de guia artistico-cultural. Participa de projetos pelo mundo afora, geralmente patrocinado por ONG's para atualizar e trocar experiencias. Seu constante desafio e' nao deixar transparecer sua falta de sentimento "nacionalista".