26.3.09

Cegueira

Franz esta' pensando em escrever um livro. Quer contar como passar por 5 faculdades dos mais variados campos possiveis em 3 paises diferentes durante 15 anos. Ele sempre achou que poderia "tirar" um pouquinho de experiencia de vida por onde passou. Tudo comecou no Chile, e o curso com nome muito peculiar se chamava "Engenharia Comercial". O professor dizia que existiam tres fontes de poder: o carisma, a lei e a violencia. Achou muito interessante aquelas palavras, e ficou impressionado com a ideia de uma pessoa mover multidoes somente com o poder de seu carisma, aliado, claro, muitas vezes, com uma boa oratoria, por exemplo. E o que era o poder? Pensou. Ah, fazer com que outra pessoa te obedeca e faca o que voce manda, ora bolas. Seja atraves de seu carisma, ou se necessario, atraves do uso da violencia! Na epoca, foi ate' o quarto de seu irmao, e lhe pediu uma cerveja. Agora. 5 minutos se passaram... Olhou para ele e repetiu: Ei, nao escutou? To com sede e quero uma cerveja agora, porra! Ficou so' nisso mesmo. Era muito mais fraco, e nem pensar em cair no braco com o primogenito. Chegou a hora de partir. Ja' havia aprendido o suficiente no Chile; aquelas ideias eram muito estranhas para serem colocadas em pratica. Pegou as malas e embarcou para Brasilia. Ficou um semestre como aluno especial e foi aceito no curso de Economia da UnB. Foi uma nova jornada e um turbilhao de ideias tambem. Nessa fase passou parte na ponte aerea Arquitetura-Economia, parte no vai-e-vem dos corredores do "minhocao". Da parte academica, lembrancas arduas de sua primeira monografia. Ficou em estado de choque quando o professor pediu no comeco do semestre o trabalho... Ele nem sabia o que era aquilo; monografia? Quando comecou as especificacoes, ficou roxo! Bem, no final, sao esses sofrimentos que ficam marcados na memoria. Parece que os professores fazem de proposito. Nunca aprendeu tanto em sua vida ate' entao. Foi a melhor monografia dos seus 15 anos academicos ate' hoje: A Derrocada da Uniao Sovietica. Lhe rendeu um nota SS. Nunca soube o que era SS, pois nunca tinha visto uma nota daquela. Para ele era algo como "Super Superior". Legal, passei; pensou de imediato. Mas a UnB nao era brincadeira. Apareceu o maldito "Calculo"! Nao, nao era calculo renal. Era matematica mesmo... Integral, diferencial, e todas essas coisas chatas. Franz precisava de novos ares. Pegou suas malas e embarcou para Fortaleza, Ceara'. Da nova faculdade nao aproveitou muito o lado academico, pois acabou tendo problemas de "incompatibilidade de sistema operacional." Numa aula, o professor nao soube responder a um aluno o que era "marketing". Franz ficou abismado com a falta de preparo do professor. Nao podia ficar passivo a tal situacao e respondeu. Pronto; aquilo acabou com ele. Ficou marcado! Dali em diante, o professor tinha sempre que dar alguma indireta para cima dele, todas as aulas. Depois disso, gracas a tres garrafas de cerveja, duas doses de pinga antes das aulas, e livros comprados e destrinchados, o curso passou na mais tranquila paz. Entretanto, sentia que faltava alguma coisa. Precisava estudar mais. Sim, uma especializacao em Relacoes Internacionais! Aguentar mais dois anos e outra faculdade seria outro problema. Por isso, escolheu de imediato a parte pratica e "punk rock" de sua monografia: vida de imigrante em Nova York. Escreveu de forma mediocre, mas viveu de forma unica, sua. Na volta a terra natal, nao conseguia mais enxergar.

2 comentários:

  1. Atrevo-me a dizer que adorei. Você sabe que gosto de coisas escritas que vem do âmago, do fundo, das vísceras. O passado sempre vem de lá? Por certo, o passado de algumas pessoas, sim. Porque marcam e essas pessoas são "especiais" no sentido de que absorvem as lições da vida. Se o passado fosse para ser esquecido não havia necessidade de viver o presente, já que muito breve,muito mesmo, está se tornando passado. Parece que a melhor companhia, depois de um bom livro, somos nós mesmos e nossas palavras escritas, e de vez em quando uma pessoa pode entrar e formar um triânfulo, uma trindade. Acho que isso sse chama povoar a solidão. Continue...

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  2. Algo "quase" confessional... a escrita, assim como a linguagem oral, é uma maneira de elaborar situações e superá-las. Na volta a terra natal (algo estranho para quem já andou em tanto lugar e não possui sentimento nacionalista)pode-se ficar cego sim, e não é apenas efeito da claridade... abraço

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Personagens

Cassandra: tradutora que trabalha para importante editora especializada em livros de biografia e historia. Ela e' o tipo de pessoa que nao consegue se encaixar numa vida social normal; encontra, muitas vezes, no isolamente, sua fulga, e nos livros seu refugio.

Cassandra: a translator who works for an important publisher specialized in biography and history books. She is the kind of person who cannot fit in a normal social life; she finds, most of the times, in self-confinement,
her scape, and in books, her refuge.
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Napo: ex-filho de militar e roteirista de cinema cuja vida foi acabada pelo alcool e drogas. Esta' em constante conflito interno consigo mesmo: perturbado, afetado. Atualmente, vive de pensao do sindicato.

Napo: ex-military-kid and film screenwriter whose life was ruined by alcohol and drugs. He seems to be always in a long-lasting and permanent state of self-conflict. Nowadays, he lives from the Union's financial support.
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Garcia: cobrador de onibus e membro ativo do partido comunista. Possui ampla biblioteca particular sobre o tema, tornando-se inclusive referencia partidaria. As vezes, seu fanatismo torna-se tao paradoxo que passa a ser ate' mesmo romantico.

Garcia: bus driver and member of the communist party. He became a political reference in the party due to the large collection of books in his private library. Such a fanatic with paradoxical ideas that sometimes he is called "The Romantic".
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Franz: editor de guia artistico-cultural. Participa de projetos pelo mundo afora, geralmente patrocinado por ONG's para atualizar e trocar experiencias. Seu constante desafio e' nao deixar transparecer sua falta de sentimento "nacionalista".